sexta-feira, 15 de janeiro de 2016

Introdução

Estou caminhando sobre um belo gramado, com o pôr-do-sol dando um tom alaranjado ao horizonte. Quando olho para baixo, vejo que não estou exatamente caminhando sobre a grama, mas flutuando a poucos centímetros do chão. Isto me parece surreal.

- Arthur. Arthur. Acorde!

Era Bruna me chamando, pois eu havia dormido no meio da aula. E estava num sono tão pesado que estava até sonhando.

- O quê? Já acabou a aula?

- Já? Foram mais de duas horas! – Desta vez era Pedro.

- Sério? Acho que eu só assisti uns 15 minutos.

Eu ainda estava duvidando que realmente havia acabado a aula. Talvez o professor tivesse resolvido parar ela no meio para um intervalo, para os que estivessem cansados de ouvi-lo falar. Seria uma boa ideia. Faço uma nota mental para sugeri-la numa próxima oportunidade.

- Qual a última parte da aula de que você se lembra? – Bruna questiona.

- Acho que estava começando a escassez de água no planeta.

- Bah, então perdeu toda a parte emocionante?

- Emocionante? Como você consegue chamar essa aula de emocionante? Eu peguei no sono quando estavam preparando-se para uma das bombas atômicas, acho que a Coreia.

- Não era da Rússia?

- Qual foi o segundo ataque?

- Rússia.

- Ah, então era Rússia, sim.

- Enfim, o professor notou que ninguém, exceto eu, estava prestando atenção. Então, mandou todos fazerem um trabalho final, sobre o período pré-Reconstrução. – Bruna fala.

- É. E na última semana do último ano na escola. – Pedro lamentava-se.

- Não sei qual o problema, nós temos essa aula todos os anos. Mesmo eu tendo dormido, eu sei escrever sobre o assunto.

- Então faz dois, por favor. – Falou Pedro, de modo desinteressado.

- Farei, mas o meu será o certo. – Eu digo, piscando o olho.

E saímos da escola às gargalhadas. Eu sentirei falta da escola. Falta dos amigos que vi e encontrava durante todos os dias. Falta da correria para chegar a tempo pois dormi um pouco a mais. Falta dessas brincadeiras feitas entre a gente ao fim das aulas. Até das aulas eu sentirei falta.

Bem, talvez não de todas as aulas. Eu não estava brincando quando disse que sabia escrever sobre o assunto do trabalho, pois todos os anos nós tínhamos aulas sobre a Reconstrução.

Basicamente, o mundo vivia com constantes conflitos, cada vez mais violentos e com mais tecnologia, levando a cada vez mais violência. As atuais teorias levam a crer que a disputa era por recursos, possivelmente bolsões de água potável.

Todos os países desenvolvidos passaram a investir cada vez mais em armamentos militares, com o intuito, em teoria, de autodefesa, até que a situação ficou incontrolável. Ocorreu um período de guerras nucleares, onde grandes bombas destruíam tudo e deixavam rastros que tornavam áreas inabitáveis, com destruição de boa parte da infraestrutura, até que foram desenvolvidas armas biológicas, que possuíam o objetivo de destruição da população sem dano à infraestrutura física. Porém, isso levou a infecções incontroláveis que dizimaram a população.

Mesmo nas partes do globo em que as construções ainda estavam de pé, não havia gente para ocupá-las. As estradas e pontes intactas não possuíam pessoas para atravessá-las. As máquinas ainda utilizáveis não possuíam operadores qualificados capazes de utilizá-las. Pouco a pouco, os diversos setores da sociedade foram sumindo. E a sociedade, que se mantinha de pé num tênue equilíbrio entre todos os seus setores, sucumbiu. Afinal, a sociedade é formada por pessoas, e sem elas ela desmorona.

Assim como nós sobrevivemos, acredita-se que existam outras comunidades que estão se reerguendo, mas a comunicação é impossível. Em parte pois diversas regiões são inabitáveis e não possui qualquer ligação e em parte porque os complexos sistemas e equipamentos necessários para comunicação em massa não possuem mais manuais de instruções e simplesmente ninguém sabe como operá-los ou consertá-los.

Os fundadores da cidade em que agora vivemos deram a sorte de sobreviver. Talvez por algum tipo de resistência intrínseca às infecções, e possuir, dentro de seu grupo, membros com as mais diversas habilidades, que complementavam-se e puderam, a partir da estrutura existente, construir uma nova sociedade.

E essa nova sociedade foi reconstruída com base em importantes preceitos morais, para que se evitem novos conflitos como aqueles que levaram à quase extinção humana. A esse processo de definição das bases da sociedade em que agora vivemos, dá-se o nome de Reconstrução.

E, para evitar que cometamos os mesmos erros que fizeram a Reconstrução necessária, nós temos aulas sobre isso em diversos momentos na escola. Por isso, acho fácil fazer um trabalho sobre isso. E, de certa forma, nem me surpreende o fato dele ser necessário neste final de ano. Pelo menos, esta é a única atividade da última semana de aula.